sábado, 27 de março de 2010

DIA DO TEATRO

"A «ideia nacional» de Garrett, corporizada na feitura de dramas que, adaptados, obedecessem ao carácter e ao gosto lusitanos, leva a que se considerem, ainda hoje, pertinentes as considerações que, apesar de moderadas pelo tom jocoso, muito de sério encerram.

Entre a leveza do sarcasmo e a dureza de uma análise histórica correctíssima, passa a fronteira que, pelo que toca ao teatro português, é de hoje como foi de sempre."

JOSÉ OLIVEIRA BARATA
("HISTÓRIA DO TEATRO EM PORTUGAL  (Século XVIII) António José da Silva (O Judeu) no Palco Joanino")

domingo, 21 de março de 2010

DIA DA POESIA




ASSIM  PENSO E ASSIM O DIGO

Se alguém
Cai num choro e se debruça
Na mágoa que as próprias lágrimas dão,
Devemos falar, apenas,
Com palavras de ternura
Que envolvam
Esse triste coração.

Se é crueldade mostrar-se
Que nos fugiu a coragem para a luta
E que não somos mais
Do que um farrapo vencido,
Sem luz, sem fé, sem valor,
- Cruel é quem ao aflito repreende
O amargo sentir da sua dor.

ANTÓNIO  BOTTO

sexta-feira, 12 de março de 2010

"CARTA"

Ivonete,
Escuta, amiga,
É demasiado aguda
A angústia gerada
Nos caminhos abertos
Do Sol
Pelas sombras
Que fazem diluir
Cinza e dor
Nos veios de água
Cuja limpidez
Nos cruza e descobre,
Para que
As gaivotas pairem
Sempre alto.

Na margem
De cada espelho
Se embosca
Alheia
Ao remorso,
A amarga beleza
Desta coragem
De olhar
A morte
Nos próprios olhos.

SÃO BANZA
(Abril, 1991)

segunda-feira, 8 de março de 2010

DIA DA MULHER , CEM ANOS


VOTO

Muitas vezes desejei ter nascido mulher.

Parece-me a única forma segura de ser plenamente humano.

Pense-se nos problemas - alimentar as crianças,
Manter a saia a boa altura e os lábios vermelhos,
Estar atenta ao calendário e ao último autocarro para voltar a casa,
Ser gentil para as dezenas de convidados na sala;
Ter de mudar de penteado  e de nome
Pelo menos uma vez; aprender a aceitar as críticas;
Conseguir que o marido continue fiel, ocupar-se da casa

E de todas as coisas pelas quais deveria estar grata
- Votos e propostas, chocolates e lugares no comboio

Ou em que deveria ser perita - máquina de escrever, pó-de-arroz, caneta, diafragma, agulha, livro de cheques, tachos, cama.

Parece-me a única forma segura de enlouquecer.
Assim, porque quereria alguém ser mulher?
Será preferível ser-se o herói ou a vítima?
Será preferível vencer, seduzir e ler o jornal
Ou ser espancada, estar grávida e ter de pôr a mesa?

Nada é gratuito. Para pagar o preço
Não seria , afinal, mais simples não ter escolha?
Só a doença, recorrente, inevitável,
Pode ensinar-nos o gosto do que é sentirmo-nos bem.

Homem algum jamais sentiu a sua filha rasgar
A carne que ele já tinha rasgado para depositar a sua semente.

Os homens conhecem a dor do nascimento através de uma espécie de teoria:
Homem algum foi protagonista da história,
Esteve a sangrar, exausto e dolorido,
Á espera dos pontos, do sono e de estar só,
Escutando, com o seio palpitante, o vagido hesitante
Ao lado da cama, que se torna contínuo com o despertar.

É esse o preço. É esse o valor do amor.
Ele vai continuar a apertar-te o coração como secundinas.

Quer o escolhas , quer não, vais pagar e tornar a pagar.
Ao longo de toda a tua vida.

Nada é gratuito na terra.

LAURENCE LERNER
("SELVES", 1969)

NOTA: a ilustração é um quadro da pintora mexicana Frida Khalo, casada com Diego Rivera.

PARA FELIZ ABRIL : Maria Farantouri